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Estudo do IGP aponta que cocaína apreendida no Estado pode ter até 100% de impureza

Pesquisa em amostras analisadas pela instituição alerta para risco à saúde dos usuários

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Uma servidora do IGP, de óculos, máscara, jaleco e luvas cirúrgicas, segura um instrumento de coleta de amostras com a mão direita sobre um tubo de ensaio segurado pela mão esquerda diante de uma bancada. Ao fundo, outra servidora do IGP aparece de costas, sentada diante de outra bancada com materiais de escritório.
Testes feitos nas amostras encontraram cinco tipos de adulterantes

Uma pesquisa realizada pelo Instituto-Geral de Perícias (IGP) revelou que a cocaína traficada no Rio Grande do Sul pode ser totalmente adulterada. O estudo realizado no IGP gaúcho é o mais amplo e recente abordando o tema no Brasil, e pode contribuir para compreender melhor o perfil de atuação das organizações criminosas no RS, além de servir como alerta à saúde pública. 

O primeiro objetivo do estudo foi quantificar o teor da cocaína nas amostras, ou seja, a pureza da droga. A pesquisa revelou que este teor de cocaína varia de 0% a 78%. A maior variabilidade de concentrações foi encontrada na Região Metropolitana. De todas as amostras avaliadas, apenas um terço possuía mais do que 40% de cocaína em sua composição.

Duas servidoras do IGP de jalecos brancos com a identificação da instituição observam a tela de um computador diante de uma bancada com outros equipamentos de informática.
Pesquisa mostrou que maioria das amostras tem pouca concentração de cocaína

Em Porto Alegre, das 54 amostras analisadas, 35 tinham menos de 50% de teor de cocaína. Em Gravataí, nenhuma das 10 amostras apresentou mais do que 40% da droga na composição. Em Canoas, apenas uma amostra tinha mais da metade de cocaína. “Por não saber exatamente o que está comprando, e diante da grande variabilidade de concentrações constatada, podemos dizer que os usuários estão gravemente expostos ao risco de intoxicações e de overdose”, afirma a chefe da Divisão de Química Forense do Departamento de Perícias Laboratoriais (DPL), Lara Soccol Gris, que também é coorientadora do trabalho.

Umas das amostras analisadas continha 0% de teor da droga, ou seja, o produto vendido como cocaína era, na verdade, nada tinha da substância e era majoritariamente composto por tetracaína. Em novembro de 2021, o DPL emitiu o laudo comprovando que este era o adulterante apreendido em um caminhão na BR-448. 

O baixo padrão de concentração de cocaína se repete nas amostras provenientes do interior do Estado. Na Região Oeste, a média aproximada do teor da droga ficou entre 15% a 35%, na Região Norte, de 16% a 40%, entre 13% a 42% na Região Central e, na Região Sul, de 14% a 41%. “Acreditamos que a cocaína já chega ao RS adulterada em algum grau. Porém, como existem muitas organizações criminosas atuando no Estado e o objetivo final do tráfico é o lucro, a cocaína é mais adulterada ainda ao chegar aqui. A pesquisa pode contribuir para a identificação dessas rotas do tráfico”, afirma Lara.

A cocaína é um poderoso estimulante do sistema nervoso central. O uso pode provocar problemas cardiovasculares, respiratórios, neurológicos e gastrointestinais, que vão de uma simples náusea até a morte. Por ter baixo rendimento nos processos químicos para obtenção, a cocaína é uma das drogas mais adulteradas no Brasil. O país está no preocupante segundo lugar no ranking mundial no consumo da droga, ficando atrás apenas dos Estados Unidos.

Do preparo até o refino, são adicionadas várias substâncias, fazendo com que a composição varie amplamente. “Ao diminuir a pureza e aumentar o volume de droga vendida, o lucro dos traficantes aumenta. Isso faz com que a composição da droga seja imprevisível, o que traz grandes riscos à saúde do usuário”, afirma a técnica em perícias Bárbara Cerveira, autora do estudo.

Mapa RS e marcação da pureza da cocaína conforme as amostras analisadas em cinco macrorregiões

Número de amostras avaliadas por região

  • Região Metropolitana (Porto Alegre, Canoas, Viamão, Gravataí): 97
  • Região Sul (Rio Grande): 17
  • Região Norte (Erechim): 11
  • Região Central (Santa Maria): 10
  • Região Oeste (Uruguaiana): 6
  • Total: 141

Adulterantes adicionados também prejudicam a saúde

Mão coberta por uma luva azul segura um tubo que contém em seu interior uma porção de pó branco.
Das 141 amostras analisadas, 42 tinham cinco adulterantes que oferecem riscos à saúde

O segundo objetivo do estudo foi determinar quais substâncias foram adicionadas para adulterar a droga. Em 42 das 141 amostras analisadas, foram encontrados cinco adulterantes  cafeína, lidocaína, tetracaína, orfenarina e benzocaína –, o que representa 30% do total. Dez amostras apresentavam dois adulterantes.

Os adulterantes orgânicos geralmente possuem propriedades anestésicas e estimulantes. Eles agem sobre o sistema nervoso central, alterando o estado mental e autocontrole do indivíduo e diminuindo a percepção de responsabilidade do usuário por suas ações. “Esse tipo de adulterante mimetiza as características da cocaína, muitas vezes o usuário não percebe a diferença", disse Bárbara.

Na Região Metropolitana, 62% das amostras estavam adulteradas com cafeína, o adulterante com maior presença. Em seguida vem a lidocaína, encontrada em uma a cada cinco análises. “As amostras com adulterantes, podem resultar em risco toxicológico, porque as doses tóxicas destes compostos, ou seja, a quantidade necessária para que essas substâncias prejudiquem o organismo, são baixas”, explica Bárbara.

Gráfico de barras mostra a porcentagem de amostras adulteradas por região e a parcela de cada adulterante encontrado em cada uma das regiões.

Os adulterantes orgânicos e seus riscos

  • Cafeína  é um estimulante do sistema nervoso central. Se consumida em grandes quantidades, possui efeitos indesejáveis como distúrbios de sono e humor, constante estado de alerta, ansiedade, inquietação e irritabilidade, levando o indivíduo à dependência. É o adulterante majoritariamente usado, possivelmente por ser de baixo custo e fácil acesso comparado aos anestésicos em geral.
  • Lidocaína, benzocaína e tetracaína  são anestésicos utilizados em clínicas para pequenos procedimentos e cuidados pós-cirúrgicos. Se administrados em grandes quantidades podem provocar desde efeitos como tontura, distúrbios visuais, sonolência, vômito, cianose, síncope, convulsões, além de efeitos cardiovasculares como bradicardia, fibrilação arterial e arritmias, coma e até morte.  
  • Orfenadrina – composto é um relaxante muscular. Dentre seus efeitos adversos mais comuns estão ataxia, distúrbios da fala, taquicardia, midríase (dilatação da pupila), tontura, alucinações e sonolência.

Outros Estados

Em estudo de 2012, acreditava-se que o Amazonas era o Estado brasileiro com a cocaína de maior pureza do Brasil, com aproximadamente 45% do princípio ativo nas amostras. Em 2009, um artigo publicado no Estado de São Paulo evidenciou cocaína com teor acima de 90% e de 73,3% no Rio de Janeiro.

Uma tese de mestrado feita no Espírito Santo, em 2012, detectou teores máximos de cocaína de até 50% em amostras apreendidas no ano de 2005, com a fenacetina utilizada como adulterante encontrado na maioria das amostras, seguida pela cafeína e lidocaína.

Em estudo realizado em Minas Gerais no ano de 2010, com a análise de 91 amostras entre crack e cocaína (cloridrato), revelou teores que variam entre 3,52% a 73,56%, com adulterantes sendo a lidocaína majoritariamente, seguida pela cafeína, benzocaína e ácido bórico. 

Texto: Ascom IGP
Edição: Carlos Ismael Moreira/SSP

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