Caso do bolo envenenado: saiba como funciona a atuação técnica do Instituto-Geral de Perícias
Publicação:
O Instituto-Geral de Perícias (IGP) desempenhou a atuação técnica fundamental na elucidação do caso do bolo envenenado em Torres, onde três pessoas perderam a vida após o consumo do alimento com altas doses de arsênio nas vésperas do Natal. Com equipes multidisciplinares, que atuaram de forma integrada, foram realizadas necropsias, análises químicas e toxicológicas, para esclarecer os fatos e fornecer provas científicas essenciais para o andamento da investigação.
A atuação do IGP junto com as forças de segurança esclareceu os fatos de forma precisa para a resolução do crime de grande repercussão nacional e internacional.
“Cada vez está mais longe alguém praticar um crime sem a perícia criminal descobrir. Nossos resultados são da ciência, e a ciência não mente. É muito importante conseguirmos dar uma resposta e sermos resolutivos. Os investimentos que ocorreram na perícia criminal pelo governo do Estado, tanto em recursos humanos, quanto financeiros demonstram o compromisso com a celeridade do trabalho pericial”, destaca a diretora-geral Marguet Mittmann.
A suspeita do crime está presa preventivamente, desde o dia 5/1, e irá responder por quatro homicídios triplamente qualificados, além de três tentativas de homicídio. O quarto caso se refere ao sogro, que, após ter o corpo exumado pelo IGP, foi comprovado que ele também ingeriu arsênio. A Polícia Civil investiga ainda se há mais vítimas e mais um corpo poderá ser exumado.
A perícia
No primeiro momento foram recebidos no IGP materiais biológicos das vítimas que vieram a óbito. Foram analisados conteúdo estomacal, sangue e urina. As amostras apresentavam níveis muito altos de arsênio, sendo incompatíveis com alguma contaminação ambiental. Além disso, exames realizados nas vítimas fatais revelaram níveis de arsênio no sangue entre 20 a 60 vezes acima da concentração inicial da faixa considerada tóxica em seres humanos, afastando por completo a hipótese de intoxicação alimentar, ou de contaminação ocupacional, acidental ou natural.
Com análises técnicas, a perícia confirmou que a farinha utilizada no preparo do bolo apresentava uma concentração de 65 gramas de arsênio por quilograma, cerca de 2,7 mil vezes maior do que a encontrada no próprio alimento. Ao longo da investigação, foram coletadas e analisadas mais de 90 amostras de diferentes materiais, contando com o trabalho integrado nas perícias de local de crime, necropsia, e exames químicos e toxicológicos. O Instituto-Geral de Perícias contou com a parceria do Laboratório Federal de Defesa Agropecuária do Rio Grande do Sul (LFDA/RS) que processou as amostras e forneceu dados e resultados com celeridade.
Pelas informações da literatura, as formas de arsênio não têm gosto e nem odor, sendo a mais comum um pó branco, às vezes acinzentado que ao olho nu não pode ser notado quando misturado com outros alimentos. Nos primeiros testes o IGP utilizou um aparelho chamado XRF, que tem como princípio a fluorescência de raio x e detecta metais como o arsênio. É uma ferramenta versátil que pode ser usada em laboratórios e na indústria, e que fornece resultados imediatos.
Exumação
O IGP realizou a exumação do sogro da suspeita, na quarta-feira (8/1), no Cemitério São Vicente, em Canoas. Inicialmente tratada como uma morte por intoxicação alimentar, o corpo foi exumado para exames laboratoriais. O arsênio é um metal pesado e os compostos de arsênio têm a capacidade de se conectar com materiais biológicos como o rim, o fígado e a queratina, presente em unhas e cabelos. Diante dos resultados conclusivos da presença de arsênio nas amostras biológicas das vítimas, do bolo e da farinha, a análise foi bem direcionada para pesquisar a presença do elemento nas amostras coletadas da vítima exumada.
A necrópsia pós-exumação consiste no estudo necroscópico, que é um exame para determinar a causa da morte, quando esta for violenta ou houver suspeita de morte violenta após a retirada do cadáver da sepultura, a fim de realizar uma perícia médico-legal. É indicada quando, mesmo recomendada, a necrópsia não ocorreu; ou nas situações em que a necrópsia foi feita, mas não responde a indagações surgidas no decorrer da investigação. No Departamento Médico-Legal, as exumações são realizadas na Seção de Antropologia Forense e Exumações, e estão sob responsabilidade da perita médica-legista Adriana Petry.
Veneno: análises, sintomas e orientações
Os sinais de envenenamento são bastante diversos, e depende do tipo da substância, via de administração (se ingerida, inalada, injetada ...), da quantidade, da idade, do peso corporal, condições de saúde dentre outras condições. Como exemplo, náuseas, vômitos, diarreia, dores abdominais, queimaduras, lesões em mucosas ou pele, alterações cardíacas, alterações respiratórias, alterações urinárias, salivação excessiva, entre tantas outras.
Nem todo envenenamento é fatal e depende do tipo de substância e da quantidade. Há venenos de efeito lento, efeito cumulativo e outros de efeito mais rápido.
Nas situações de intoxicação são feitas análises periciais, que englobam a pesquisa de psicotrópicos e venenos tipicamente utilizados no Rio Grande do Sul, tanto em sangue quanto em urina, conteúdo estomacal e vísceras. O material é avaliado, amostrado, extraído com solventes orgânicos e primeiramente analisado por um método analítico que identifica diferentes substâncias em uma amostra de teste.
Na suspeita de ocorrência de uma intoxicação ou envenenamento deve ser procurado atendimento médico para diagnóstico e implementação do tratamento mais adequado ao caso. Outra possibilidade é buscar orientação junto ao Centro de Informações Toxicológicas (CIT) do RS pelo telefone 0800.721.3000 - serviço que funciona 24h.
Texto: Anelize Sampaio/Ascom IGP